Eis um ponto que pipoca nos comentários das minhas redes sociais: As falsas acusações na Lei Maria da Penha são impuníveis, “um absurdo que as mulheres não respondem por essas mentiras”, “não é interesse do estado em processar a mulher”, “elas devem pagar por essas mentiras” etc.
Pois bem.
Quando estamos diante de situação que envolve violência doméstica e familiar contra mulher, sabemos que meros indícios são suficientes de vê-lo submetido às medidas protetivas de urgência, processado com base em apenas uma declaração e, ao fim, por vezes até condenado com base na “coerência das declarações prestadas pela vítima tanto em sede policial, bem como perante este juízo, não sendo possível inventar uma situação com tantos detalhes e mantê-la em todas as vezes que foi ouvida”. Já o inverso é bem diferente.
Ao se constatar que o inquérito policial ou a ação penal que apurava a responsabilidade criminal do homem por eventual violência doméstica e familiar contra a mulher foi fruto de uma mentira, uma história inventada à propósito de se vingar (por alguma razão) ou qualquer que tenha sido a sua motivação, não basta que a mulher fale na presença do Juiz a sua trama e pretensão, por mais escancarada que seja para se ver processada. NÃO. O órgão acusatório deve buscar outros elementos que indiquem que toda história inicial foi realmente uma invenção, uma mentira, e só então, talvez, processá-la por denunciação caluniosa (art. 339, do Código Penal).
Comissão Permanente de Promotores da Violência Doméstica do Brasil (GNDH/CNPG)
Enunciado nº 15 (001/2014): Considerando as pressões para a retratação a que as mulheres vítimas de violência doméstica estão usualmente expostas, caso a mulher afirme na fase investigativa que foi vítima de crime praticado em situação de violência doméstica e familiar e posteriormente negue os fatos em Juízo, o seu processamento por crime de denunciação caluniosa apenas será admissível se houver outros indícios suficientes de que o primeiro depoimento foi inverídico.
Percebe a diferença? Enquanto por um lado a mera declaração basta para processar criminalmente o homem, ainda que seja mentira, incumbindo a ele a provar a inocência, por outro lado quando a própria mulher informar que aquela primeira versão era inverídica e que tudo não passou de uma invenção, o Ministério Público, conforme o enunciado acima, deverá apurar outros indícios de que realmente o primeiro depoimento dela foi mentira, o que, por evidente, se autoriza a disseminação das falsas acusações na Lei Maria da Penha.
Dois pesos, duas medidas.
Vinícius Vieira
Advogado especialista na defesa do homem acusado e vítima de violência doméstica
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